Transcrição do parecer

Parecer apresentado por Affonso de Dornellas à Comissão de Heráldica da Associação dos Arqueólogos Portugueses e aprovado em sessão de 30 de Outubro de 1937.

Desejando a Câmara Municipal de Miranda do Corvo que lhe sejam estudadas as suas armas, bandeira e selo, dirigiu-se a Associação dos Arqueólogos para esse fim.

Nas obras impressas, que versam sobre a heráldica municipal, não há referência ás Armas de Miranda do Corvo, mas esta Vila enviou a Associação dos Arqueólogos uma reprodução do seu selo que consta de uma se torre, tendo a porta um busto do qual não percebe o sexo e no alto das muralhas parece ser rematada por umas pequenas árvores em forma de cipreste. A torre é acompanhada por duas estrelas de oito raios.

No pelourinho, de que vieram fotografias, aparece, numa das faces, uma janela ou uma porta, tendo um busto assente na base.

Noutra face, as Armas Nacionais com coroa aberta.

Na Biblioteca da Câmara Municipal do Porto, existe um manuscrito com desenhos, denominado "Arte de Armaria e Brazões de Cidades e Vilas de Portugal". É o códice 498. Deve ter sido terminado depois de 1680, por aparecer esta data no capítulo que trata de Montemor o Velho, não se sabendo porém quem foi o autor. Esta obra inclui o desenho das armas de Miranda do Corvo que constam de uma torre tendo sobre a porta um busto que parece ser de homem por ter os cabelos curtos. A parte descritiva diz:

- Tem por armas esta villa hữa Torre sobre aguas entre duas estrellas de oito pontas. E sobre a porta hữ meo corpo. E assi estão no sello q usa cổ hữa letra ao redor diz .S. DO CONCELHO DE MIRANDA. O Rio rega os campos desta villa se chama Duega q no termo de Penella nace em hữa mui grande fonte se chama o olho de Duega: outro Rio mais pequeno passa por esta Villa q se chama Alheda.–

Parece-nos pois que se deve conservar o que está, se bem que não encontremos a explicação do busto e das estrelas, pois do castelo ainda existem restos e de facto é interessante estar sobre águas como se diz na descrição acima, pois a Vila é banhada pelos rios referidos.

No princípio da Nacionalidade, o castelo desta Vila, com os de Soure, Santa Eulália e outros, constituíam uma das linhas de defesa de Coimbra contra os ataques de mouros, tendo portanto o Castelo de Miranda a sua história. O busto será de algum defensor? As estrelas quererão indicar que o castelo e portanto a Vila tenham sido tomados de noite?

Miranda pertencia á Família Sousa, que para aqui nomeava as justiças. Será o busto que figura por cima da porta da torre, de algum dos notáveis senhores da Família Sousa?

Além do busto e das estrelas cuja representação desconhecemos, parece-nos que a torre representa bem a história local, assim como os rios representam a fertilidade regional.

Assim sendo, somos de parecer que as armas, bandeira e selo da Vila de Miranda do Corvo, devem ficar assim ordenadas:

ARMAS - De ouro, com uma torre de vermelho, aberta e iluminada do campo e carregada ao centro por um busto de carnação, vestido de prata. A torre, acompanhada por duas estrelas de vermelho de oito raios. No contrachefe, três faxas ondadas, duas de azul e uma de prata que sustem a torre. Coroa mural de prata de quatro torres. Listel branco com os dizeres "Vila de Miranda do Corvo". -

BANDEIRA - Vermelha. Cordões e borlas de ouro e de vermelho. Lança e haste douradas. -

SELO - Circular, tendo ao centro as pegas das armas sem indie cação dos esmaltes. Em redor, dentro de círculos concêntricos, os dizeres "Câmara Municipal de Miranda do Corvo".

Como a torre, que é a peça principal das armas, é de vermelho, a bandeira é desta cor. Quando destinada a cortejos ou outras cerimónias, a bandeira é de seda e bordada, devendo medir um metro quadrado. Quando é para ser arvorada, é de filel e terá as dimensões que forem julgadas necessárias, podendo neste caso deixar de incluir a representação das armas.

O ouro indicado para o campo das armas e para o aberto e iluminado da torre, é o metal mais rico da heráldica e significa nobreza, fé, fidelidade, poder e liberalidade.

O vermelho das estrelas e da torre é o esmalte que significa vitorias, guerras, força, vida, energia e actividade.

Na heráldica, os rios são representados por faxas ondadas de prata e de azul. A prata significa humildade e riqueza. O azul significa zelo, lealdade e caridade.

Com estes esmaltes e estas peças fica bem representada a história e fertilidade da região e a índole dos seus naturais.

Se a Câmara Municipal de Miranda do Corvo concordar com este parecer, deverá transcrever na acta a descrição detalhada das armas, bandeira e selo, e enviar ao Sr. Governador Civil uma cópia autenticada dessa acta, juntamente com os desenhos rigorosos da bandeira e do selo, pedindo-lhe para remeter esses elementos a Direcção Geral de Administração Política e Civil do Ministério do Interior para, no caso do Sr. Ministro concordar, ser publicada a respectica portaria.

Sintra, Setembro de 1937.

Affonso de Dornellas.

 

Fonte: Processo do Município de Miranda do Corvo (arquivo digital da AAP, acervo “Fundo Comissão de Heráldica”, código referência PT/AAP/CH/MCV/UI0010/00107).